segunda-feira, setembro 04, 2006



Jesus Cristo
- Homem Novo para renovar o homem -
- V -
8. E como é que sabes? Tens a certeza? Tens?
- Critérios / argumentos da historicidade de frases e factos -
A partir de tudo o que ficou dito muito se discutiu sobre a possibilidade de confirmar afirmações, acções, factos na vida e na história de Jesus. Os critérios/argumentos que paulatinamente se foram elaborando não são receitas infalíveis mas têm a vantagem de sistematizar os diversos argumentos que intervêm num debate científico sobre a realidade e, dessa forma, podem ajudar a ler o “real” e o que se diz dele.
Podem indicar-se muitos critérios. A teologia hoje trabalha muito de perto com as ciências humanas e os métodos histórico-críticos. Mas, evidentemente, não pode fechar a porta apenas segura dessas ciências ou métodos já que a fé e o saber se relacionam, desafiam e fundamentam reciprocamente[1].
Eis então os cinco critérios mais utilizados:

1º) Uau! Nunca tinha visto nada disto!
– A originalidade radical –
Chamado critério da “falta de semelhança”, o critério da originalidade radical é extremamente simples: procede de Jesus tudo aquilo que nos Evangelhos e tradições cristãs não se deixar verificar como vindo de outra fonte (por exemplo o Judaísmo do séc. I ou do Cristianismo nascente). Resumindo, virá de Jesus (palavras, gestos e ensinamentos) tudo aquilo que já não é judaico e ainda não é cristão. Este critério supõe três hipóteses: um bom conhecimento do mundo judaico da época de Jesus; um bom conhecimento da Igreja primitiva; a “falta de criatividade” por parte dos discípulos de Jesus. Por isso é um critérioa usar com muito cuidado.

2º) Isso não se inventa
- A dissonância eclesiástica –
É, de certa forma, uma variante do critério anterior. E é muito simples: é difícil conceber que a comunidade cristã primitiva pudesse inventar coisas que a pusessem em dificuldades a ela própria. Por exemplo, se não fosse verdade, porquê dizer que no grupo de Jesus havia Judas, um traidor? Ou então porquê dizer que Jesus recebeu o baptismo de João Baptista se esse baptismo, diz o mesmo texto, era um baptismo para arrependimento dos pecados? Seria Jesus um pecador segundo a comunidade primitiva? Ou o que significaria a afirmação de que Jesus era um “comilão e um ébrio, amigo de publicanos e pecadores” (Lc 7, 34).

3º) Toda gente diz
- O testemunho múltiplo –
Este critério significa que quanto mais está testemunhado um elemento por fontes independentes entre si ou, mais vagamente, por correntes tradicionais independentes, maior é a probabilidade da sua antiguidade. O testemunho múltiplo é válido igualmente no estudo das formas literárias. Quando um elemento é citado apenas por uma tradição, a probabilidade da sua antiguidade é menor. Quando o testemunho é múltiplo, mesmo que tenha assumido diferentes formas de ser dito, é um critério de afirmação da historicidade. Sabemos que existem fontes diversas nos Evangelhos, sabemos que estão misturadas e sabemos, inclusive, que citam elementos comuns. Tanto é assim que existem três Evangelhos chamados “Sinópticos” por isso mesmo.

4º) És sempre o mesmo
- A coerência –
Uma vez que foi possível, através dos critérios anteriores, estabelecer que algumas palavras e acções reportam de facto a Jesus (se não na forma, pelo menos na substância) é também possível traçar uma imagem de conjunto do ministério de Jesus: é possível identificar as linhas fundamentais da sua mensagem bem como as diferenças em relação à sua acção. Se um elemento se integra devidamente nesta imagem de conjunto é porque a sua historicidade é provável e pode ser considerado autêntico. Se o elemento não está coerentemente encadeado e relacionado aos restantes elementos a sua autenticidade pode ser posta em causa. É um critério que se impõe por simplicidade e evidência.

5º) Fia-te … e corre
- A fiabilidade histórica –
Por fiabilidade histórica não se entende um critério particular mas sim um conjunto de argumentos ou critérios. Todo o historiador remonta dos efeitos às causas, procura as explicações necessárias e suficientes para os fenómenos. No nosso caso o critério aplica-se quando nos interrogamos pela continuidade entre o movimento de ideias e comportamentos gerados por Jesus e o cristianismo nascente. Este é o processo que faz uma leitura retrospectiva: da comunidade cristã até Jesus Cristo, sua origem. E é aí que a história, seus contextos e horizontes, joga um papel importante. Jesus é um Judeu do séc. I. Nenhum historiador discutiria este facto. Mas faz com que não se possam atribuir a Jesus gestos e acções incompatíveis com essa condição.
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[1] Cf. Jacques SCHLOSSER, Jesus, el profeta de Galileia (Salamanca: Sígueme, 2005) 67.

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